1.18.2007

Perda

Pinto de luz a mesma aguarela, e é da mesma varanda que vejo o mar e respiro o mesmo vento, e os lábios entreabrem-se num sorriso cheio de vida, e sinto-me pequeno porque a beleza de tudo me esmaga e explode em mim.
E vou em frente, lidero o trilho, desbastando atalhos e veredas, cruzando caminhos, criando mapas.
Apaixono-me. Vivo, revivo, sinto intensamente, renasço, reinvento-me, sinto a beleza das manhas de Verão. Emociono-me e choro, e olho as estrelas e aqueço as noites num abraço imenso que é só dar.
Tornam-se audíveis sons que sempre ignorei. Alguém me salva os dias que vou moldando com ilusões como molda com suor o oleiro um pedaço rude de barro.
Mas tudo vai escurecendo como um entardecer, solitário e fatal. Canso-me de sonhar, outra vez, vencido pelo cansaço. Os dedos abrem-se lentamente, o tesouro que guardava é pó que o vento acaba de levar.
Quimérico e irreal, não está cá ninguém! Miserável. Chorar a partida de alguém que nunca esteve!
Pobre criança! Louco! Demente! Volto sempre ao lugar onde ninguém me segue, onde me largam a mão, onde o archote se apaga e perco o equilíbrio e já não sei para onde vou. Perdi-me. Perdi.
A minha alma é uma grande muralha, escura, fria, intemporal e é sempre na perda que eu me vejo, que eu me reconheço, que eu me contradigo!

Paulo Sousa

1.13.2007

...não...

Hoje creio num Deus, que só O é porque não existe, porque faz parte do seu mistério não ter uma forma, se tivesse seria outra coisa qualquer, nunca um Deus. Terei evoluído? Não sei. Todas as certezas insistem em recriar-se poderosas duvidas.
Já todos partiram, “cumprindo os fados” chamando as coisas de destino. Por cá vão ficando memórias e mais memórias, tantas que são já desesperos em forma de tempo. Como paredes cuja tinta denuncia o abandono onde se perpetuam dias de sol e de chuva, em infernais repetições. Só ficam os que se perdem, porque acreditam. Aqueles dos sonhos. Esses mesmos, os das fantasias…
E caíram, já, todas as folhas deste Outono. Pelas ruas há só, árvores despidas e vento, murmúrios de gritos, que foram fonte e maresia, voos de aves que nunca estão, que partem simplesmente, que partem sempre.

Paulo Sousa

1.09.2007

És Musica,
Quebras o silêncio e o gelo. Flutuas intangível.
Deixo que os olhos se fechem numa espécie de meditação e vibro a cada compasso. Imagino-te… A tu voz!... Apetece-me sorrir. Éter, apenas! …
O violino chora! Arranca notas a um espírito inteiramente submerso em si,
que devolve ao ar sons que tocam a pele, que balançam os sentidos.
A harpa oferece magia ao toque dos dedos e o piano ilustra-te num horizonte etéreo e brilhante!...
Divinamente humano!... Como eu te sinto!.. És música!
Despertas os mais recônditos medos, num genuíno sentido de arte.

Paulo Sousa