12.10.2007

E se falo de...

E eu, que sonhava conhecer o mundo inteiro, deixo-me ficar esquecido no conforto de não ter que sair daqui…
E se falo de mar, falo da ponta dos teus dedos,
Se falo de azul renego os fantasmas na memoria dos nossos desejos.
Eu, que não me recordo de ter tido nada, comove-me, que na tua fantasia um dia tenha sido teu e que tenhas, enfim, existido por nós. Desvario!
Mas se falo de verde é só porque o brilho dos teus olhos me assombra.
A noite chega outra vez…fria…cruelmente igual a todas as outras, espreitando-me pela janela, certa de que eu repetirei os mesmos gestos!
E se falo de ti é só para fugir de mim, do que eu tenho, do que eu sou.
Vou desfiando soluços nessa ambígua imagem que te ofereci, algures entre os restos do que um dia fui!..

foto from olhares.com

12.01.2007

Por-do-sol


O final de tarde visto da minha varanda! :)

11.25.2007

Dizeres IV

Imagino-me um barco navegando um oceano imenso.
Um barco sem velas num mar sem vento.
Por vezes as ondas fazem ranger as velhas tábuas de madeira gasta e esbatida e tudo adquire um tom fantasmagórico.
Não sei o que me fez partir nesta viagem, não sei se algo me empurrou, se tropecei no destino ou se estava no porto e simplesmente embarquei…
À noite experimento miragens ou alucinações que sempre me vão levando para longe daqui, que vão moldando o horizonte que a luz do dia mostra sempre igual.
Deixo-me levar pelo balanço e rumo em direcção a terras prometidas.

Sinto ventos de sorte sobre velas inventadas…e sigo…sem terra à vista nem porto de abrigo…

11.16.2007



Não me perguntes o porquê deste silêncio…

Mais uma noite caiu, e para ti, tenho apenas o eco das palavras já tantas vezes repetidas. Hás-de lê-las na escuridão do teu quarto entregue a isso que te resta.

Não me fales de solidão e de distancia…

Trago na alma o cais das partidas, as noites em claro, o rosto exausto de muitos dias olhando a imensidão azul por aqueles que haviam de voltar.

Não me fales de futuro nem de esperança…

Afinal, é a resignação nesses teus gestos que vai quebrando o ritmo dos meus passos, é a ausência da tua voz que me vai mergulhando no silencio do tempo.

Não me perguntes pelo amor que tu sonhas e que eu sinto…

Esse amor das tuas palavras bonitas que eu espalho em todas as horas do meu dia e com que tu enfeitas as folhas nas gavetas escondidas…

Não me perguntes o porquê do meu silêncio
Quando ambos sabemos que é o teu que nos separa.

10.17.2007

Divagando

Não sei de nada. Não sei mesmo! Apenas que esta musica e este cigarro são o conforto neste quarto branco e frio.
Há dias em que me vejo sorrir, entre a memoria do beijo longo e a cumplicidade do abraço roubado ao tempo que nos roubavam. Tínhamos sempre tão pouco tempo, lembras-te?
Era sempre noite e a sensação de fuga fazia bater mais forte no peito o coração. E fugíamos nem sei de quê, íamos de fuga em fuga como se não pudéssemos parar.
Davas-me a mão para me dizer, sem as palavras que sempre preferias reter entre a garganta e o olhar atento à estrada, que tudo estava bem, que renascíamos bebendo estes momentos tão únicos, tão nossos ate a exaustão dos sentidos, como se o saciar dessa sede fosse o indicio de um desejo infinitamente insaciável.
Não sei de nada, não! Mas quero-te nestas divagações a que me dou quando a solidão fala mais alto, nesta ansiedade que vou disfarçando mais um dia até que possa, de novo, renascer em ti.

10.12.2007

Dizeres III


Recordo-me que o mundo era bom quando segurava a mão da minha mãe nas voltas da cidade. Quando adormecia junto ao seu peito, com a segurança do seu braço firme nas minhas costas, durante as lentas viagens de autocarro.

Cresci, tudo se complicou, e as vezes preciso tanto deitar-me nesse conforto que o tempo arrancou de mim.

10.05.2007

Dizeres II


Queria escrever-te, mas as palavras estão velhas e gastas, arquivadas, rebuscadas, como gavetas cheias de coisas fora de tempo e assombradas de memorias. Sei-as de cor e guardo-as para te sussurrar ao ouvido quando o amor deixar de queimar como acido na pele da alma. Guardo-as para nunca tas dizer.
Enquanto algures por aí, alguém escreve poemas de amor,
tu
Deitas-te de longe no silêncio do meu rosto adormecido,
e eu acordo em ti,
exposto, como o céu na superfície nua do mar.

10.01.2007

Poema


Queria um poema escrito por minguem e ninguém nunca o encontrasse, com cheiro a eucalipto e a mato.
Sonho com um poema sem rimas, pleno e absoluto, a saber a maresia e a vento.
Um poema que envergasse a lucidez do sol marcando o tempo, e a
força da chuva varrendo os tectos da cidade.
Queria muito mais profundo o oceano e muito mais longínquo o firmamento, trazer as mãos carregadas de estrelas e o coração pulsante como um vulcão em chamas.
Um poema feito essência…leve…com aroma de terra molhada pela manhã. Que te invadisse a alma e os sentidos, que te levasse a uma dimensão etérea, onde a melodia perfeita dessa musica que eu não sei, fosse palavras a renascer continuamente…
E nesse poema que não sei se existe, guardo tudo o que tenho para te dizer…
…aqui no outro lado de mim.
foto from ollhares.com

9.12.2007

Depois de ti...


Depois de ti passaram muitas vidas!

Depois de ti romperam madrugadas detrás de outras janelas, encheram-se de verde muros outrora vestidos de cinza.
Depois de ti, houve confortos nascidos nos gestos repetidos de iludir a face que o espelho reflectia.
Depois de ti eu, sempre eu! Ainda cá estou e tantos dias que fugiram.
O velho caderno mudou de textos e de tinta. O Outono voltou a despir as árvores na rua que passa mesmo á tua porta, e eu parei para ver se ainda te via, mas meu amor, isso foi depois de ti, e a rua era só o vento que corria.


foto from olhares.com

9.08.2007

Dizeres I


A minha vida, sem ser boa nem má, é contada apenas no chiar do vento arrastando coisas pelas ruas, na ilusória alegria das voltas repetidas do carrossel, num bater de porta em porta e nunca pedir.

Chorar porque tudo me está “à flor da pele “. Porque um violino geme a minha condição numa peça fantasticamente triste.

Esperar…esperar…esperar sempre de olhos fixos num céu carregado de estrelas.

Sofrer a eterna condenação de ter a alma repleta de emoção e esbanjar ternura num dar de mim que não aprende a ser apenas gesto de retribuir um gesto, apenas.

Foto from olhares.com

9.07.2007

...como o vento...

Foste vento que passou agitando um grito contido no peito.
Dormia, ancorado a um sentimento de não estar por não ter para onde ir.
Dormia, e tu surgiste no sono profundo e mataste-me a sede.
Senti balançar o corpo, encharcaste-me de vida como se regressasse a mim num arranco supremo de ansiedade.
Chegaste quando pensei que já não vinhas e de repente o sonho era um mundo inteiro por descobrir, um gesto novo por aprender, uma tela em branco a colorir.
Olhei nos teus olhos profundamente e em silencio confessei-te o medo de sentir, e num olhar de água respondeste-me que era tempo de ficar.
Quis acordar e num gesto derradeiro para sentir o coração bater estendi a mão para te tocar e já não estavas, foste o vento que passou, o vento que não pára, que não fica, e eu sou apenas um soluço, um vulto arrancado à noite, preso algures por aí num pedaço de ar em movimento.

7.16.2007

foi assim...

Foste breve, como alias seria de esperar. O teu olhar intenso, assustado, sem saber se fica ou se vai. Uma desesperante luta de ti para ti e eu no outro lado da linha sem saber ao certo se sim, se não, se nada!... Não quiseste, mas esse fogo queimou, fugiste mas o teu olhar ficou…perdido na retina do meu.

6.14.2007

Hoje sei...

Ensinei-te tantas coisas que nem me lembrava que sabia. Mostrei-te o caminho do silêncio, o verdadeiro som e o alimento que há na música. Levei-te a ver o cume da montanha e as flores que despontam, coloridas, na imensidão das rochas escarpadas.
No meu corpo dei-te a vida que despertavas em mim a cada toque e todo o prazer que gotejava com o suor das horas gritadas sem tempo.
Muito mais que as palavras e os gestos, nos teus olhos, nesse olhar profundo, deste-me o maior de todos os tesouros, a certeza de que é possível, de que existe esse devaneio descrito nas linhas dos poetas.
Caminhámos juntos de mãos dadas e sorriso nos lábios mas olhávamos em silêncio, sem saber, diferentes direcções.

Ficaste em mim...e eu devo ter seguido contigo!...

6.05.2007

Final de tarde


Venho sempre à varanda no fim de tarde, gosto de sentir o vento no rosto trazendo um friozinho que arrepia a pele, quase como um ritual inconsciente, fico encostado à porta olhando a paisagem ou o vago.
Hoje encontrei-te no final da minha tarde.
O teu rosto numa vaga memoria nesta mesma varanda, o abraço reconfortante – “Estou aqui, vou estar sempre aqui”.
A imensidão de agua e verde, a distancia. Não ficaste.

Uma lágrima cai enquanto o sol morre, escarlate, lá longe no mar.
A minha varanda no fim de tarde, fantástica, como um minuto de silencio em gesto de homenagem.

5.22.2007

Sonhar-te

Hoje vou dormir mais cedo. É na tranquila escuridão do meu quarto que eu te sonho, que eu te vejo sorrir. É numa realidade desenquadrada e improvável que tu surges por entre o caótico emaranhado de cenas, e posso ver-te tão nitidamente por vezes. Posso ter-te, sentir-te até, cruzando imagens no subconsciente, beijar-te.
Talvez um dia vá dormir mais cedo só para que a noite se prolongue ao teu lado e possa enfim amar-te. Acordado.

5.12.2007

Por aqui l

Vou ficando por aqui enquanto o tempo se arruma devagar. O tempo a conta gotas e o armazenar de memórias em caixas, dispersas, por organizar.
Não sei quem ganhou e quem perdeu, quem partiu e quem ficou. Não me importam cálculos nem paralelismos nem retóricas nem metáforas.
Quero sair daqui. Espero o dia que será sempre amanha, um canto, um chão, um abraço.

O olhar já vai quebrando pelo cansaço e os móveis parecem fitar-me com estranheza. Serei mesmo daqui?
Fecho os olhos e sou apenas a voz que canta o silêncio do vento que não passa. A imensa nostalgia de um olhar perdido atrás de uma janela.

4.28.2007

(...)

Sentado a um canto vejo o tempo a passar. Indiferente. Os móveis adquirirem o tom baço do pó. As horas passam desordenadas, não as sinto. Não sei que horas são! Como se levitasse numa dimensão sem tempo, não me sinto envelhecer, sei apenas que anoiteceu outra vez.
Se fecho os olhos escapo no sonho, dou-lhe um rosto. É quase verdade não estar aqui, não ser eu, existires. Estendo a mão no vazio e por breves momentos existo.
Mais umas horas, a janela revela o novo dia, timidamente primeiro, depois em viva claridade.
No mesmo canto eu. Ao lado o tempo empastado nestas quatro paredes.

4.11.2007

Como o Lago...

Não sei nada, absolutamente nada! Mas quero abraçar este vazio, quero essa consciência e a simplicidade das pequenas coisas. Quero os dias uns atrás dos outros mesmo que sempre iguais, aprenderei que a luz se despede do dia devagarinho, que tudo é precioso porque passa e que a noite pode ser de paz e tranquilidade.
Não quero ver a vida a passar, quero me toque quando passa!
Quero cuspir ou engolir este nó na garganta (tanto faz)!
Quero mais alto o sonho. No meio desta inquietante ignorância aprender a não ter, quero a estrada de pés descalços e a alma atenta ao som do piano que sempre acende quando os silêncios ferem e consomem.
Como um lago, ver passar as estações, sentir a bênção da chuva quando cai e a inconstância do vento que não fica.
Quem sabe, envelhecer ao som do violino que sempre chorou dentro de mim mas que sempre foi melodia e foi razão para sonhar…

Paulo

3.30.2007

Uma ultima noite

Sente este frio que a noite foi trazendo de mansinho.

Sente o corpo marcado por esta ausência que não mente.

Bebe este momento, que em mim tudo se engana e se rende.

Fica um pouco mais que este tempo é de desejo e luar

Ama-me, que o nosso tempo partiu quando foi tempo de ficar.

Dorme no meu peito, segura na minha a tua mão

Entrega ao silêncio o fulgor da hora que vai passando…

E deixa-me entregue ao que restou da solidão

Deixa-me sozinho que amar-te mais eu não podia

Acorda, solta-me os braços, desprende a madrugada...

É tempo de nascer um novo dia!...

Paulo

3.28.2007

hoje...

Hoje ao chegar a casa, parei o carro, rodei a chave e deixei-me ficar com as mãos no volante e o olhar perdido nem eu sei onde. Fiquei assim por algum tempo - para quê sair daqui? Para quê subir aqueles degraus e abrir a porta?
A casa está tão vazia e tão fria que parece desabitada. Estou cansado e não me apetece enfrentar este final de dia! Ninguém me espera para lá daquela porta, nenhum cumprimento, nenhum sorriso, nenhuma razão para entrar… deixo-me ficar aqui, assim... no rádio passa uma musica qualquer e eu sinto um abandono que me esmaga, que me afunda no banco do carro e não me apetece fingir, não me apetece sair…

3.18.2007

Inaptidão

Tanto que eu já disse, tanto já escrevi e as ideias continuam num sufoco acorrentado na garganta e no pensamento.
A realidade continua a antítese do sonho, inexpressivamente nas folhas que vou enchendo de palavras.
Pudesse eu ter a inspiração que dissesse verdade na tão humana e presente necessidade do desabafo.
Pudesse eu chorar este incontido desejo que sinto e que jamais poderei gritar onde me ouçam…

Paulo

3.12.2007

Devo ter morrido

Um dia a felicidade coube toda dentro deste quarto pintado de branco e simples como a própria palidez.
Um dia houve tardes quentes de Verão e sorrisos debruçados sobre um azul encharcado de luz, e o sal fazia desenhos engraçados na pele e o vento sabia a liberdade.
Um dia os olhos brilharam num tom que ninguém nunca conheceu.
No tempo que acreditava, um abraço vencia todos os cansaços e um beijo roubava luz aos astros e nunca era noite. Havia fanfarras e arraiais e risos enfeitando as gentes felizes na simplicidade de uma fé sempre presente, na grandeza de tudo se resumir a isso mesmo. Tempos de palavras bonitas e de intimidades como se tudo fosse o cumprir da profecia e o universo conspirasse uma união há muito esperada.
Devo ter morrido no apogeu de mim.
Acordei e a felicidade cabe toda numas simples folhas de papel que o peso do tempo vai acumulando de pó e distância.

Paulo Sousa

3.01.2007

Ser assim

É nesse horizonte que eu não me vejo que eu sou feliz. É nesse encontro que eu nunca tive que eu me sinto e que sei quem sou. É nesta imensa nostalgia que acho o conforto que conheço.
Salva-me a ilusão que há em cada incerteza e vou despertando os sonhos no passar das horas, no morrer dos dias.
É nunca estar quando a vida me pede que esteja, é não partir quando lá fora tudo chama por mim, é um querer leal e desmedidamente, é ir errando como quem avança sem poder ver o chão que trilha.
É ser essa rocha imensa, inerte e fria e chorar silenciosamente.
Ser gelo que não sente, que fere, que queima, e ter a brisa suave da primavera.
É ser a montanha altiva e distante, solitária e tosca e despertar fonte de vida na alvorada com o nascer do dia.
É querer ficar eternamente ouvindo o estalar quente da fogueira e ser gota de chuva procurando desesperadamente o mar.
É ser mais um, caminhando apressadamente pela rua. Ser todos esses,
e trazer sempre comigo a solidão a soluçar na verdade de um sorriso.

Paulo

2.24.2007

Palavras...

Depois de tudo ficam sempre as palavras. As que disse, as que não disse, as que ouvi e que guardei, as que quis ouvir e com as quais sonhei.
Ficam os poemas e as rimas inesquecíveis, o poder dos grandes poetas tratando a lua por tu ou por mãe, fazendo da chuva as lágrimas da infinita tristeza ou a bênção e a dádiva da vida.
Ficam textos marcantes que registam momentos singulares de uma vida, de muitas vidas, que não sendo nossos espelham a nossa existência num sentido de grandeza poética e de pura inspiração.
Ficam sempre as canções numa memória cheia de tristezas e de desesperos ou de risos e quentes abraços, canções que sempre tomamos como nossas, como se as tivessem escrito para descrever o que sentimos, como se o autor nos conhecesse e nos cantasse.
Depois de tudo e no fim, ficam as palavras. Palavras que são a nossa vida, que recordamos, que revivemos, que dedicamos, que sentimos, que esquecemos, e que podemos sempre reordenar dando-lhes um novo sentido.

Paulo

2.15.2007

Se...

Se eu escolhesse amar-te serias mais uma ilusão que o tempo se encarregaria de diluir, de fragmentar, de destruir.
Se eu escolhesse amar-te serias só mais uma distância por entre tantas, mais um toque de dedos, um murmúrio junto ao ouvido que eu nunca daria, que eu nunca diria.
Se eu escolhesse amar-te como tantas vezes já te sonhei, como tantas vezes já te escrevi, já te pintei, já te construí e inventei, saboreei e decorei cada toque do teu corpo, sei que mesmo assim não te teria.
Ah, se eu te escolhesse! Se eu pudesse! Se tu pudesses…
Se pudesses ver-me cá do outro lado, ainda que não pudesses, escolher-me-ias! Ainda que não soubesses, amar-me-ias!
Mas tu não podes, não consegues ver-me e eu não posso escolher, não te posso amar.

Paulo Sousa

1.18.2007

Perda

Pinto de luz a mesma aguarela, e é da mesma varanda que vejo o mar e respiro o mesmo vento, e os lábios entreabrem-se num sorriso cheio de vida, e sinto-me pequeno porque a beleza de tudo me esmaga e explode em mim.
E vou em frente, lidero o trilho, desbastando atalhos e veredas, cruzando caminhos, criando mapas.
Apaixono-me. Vivo, revivo, sinto intensamente, renasço, reinvento-me, sinto a beleza das manhas de Verão. Emociono-me e choro, e olho as estrelas e aqueço as noites num abraço imenso que é só dar.
Tornam-se audíveis sons que sempre ignorei. Alguém me salva os dias que vou moldando com ilusões como molda com suor o oleiro um pedaço rude de barro.
Mas tudo vai escurecendo como um entardecer, solitário e fatal. Canso-me de sonhar, outra vez, vencido pelo cansaço. Os dedos abrem-se lentamente, o tesouro que guardava é pó que o vento acaba de levar.
Quimérico e irreal, não está cá ninguém! Miserável. Chorar a partida de alguém que nunca esteve!
Pobre criança! Louco! Demente! Volto sempre ao lugar onde ninguém me segue, onde me largam a mão, onde o archote se apaga e perco o equilíbrio e já não sei para onde vou. Perdi-me. Perdi.
A minha alma é uma grande muralha, escura, fria, intemporal e é sempre na perda que eu me vejo, que eu me reconheço, que eu me contradigo!

Paulo Sousa

1.13.2007

...não...

Hoje creio num Deus, que só O é porque não existe, porque faz parte do seu mistério não ter uma forma, se tivesse seria outra coisa qualquer, nunca um Deus. Terei evoluído? Não sei. Todas as certezas insistem em recriar-se poderosas duvidas.
Já todos partiram, “cumprindo os fados” chamando as coisas de destino. Por cá vão ficando memórias e mais memórias, tantas que são já desesperos em forma de tempo. Como paredes cuja tinta denuncia o abandono onde se perpetuam dias de sol e de chuva, em infernais repetições. Só ficam os que se perdem, porque acreditam. Aqueles dos sonhos. Esses mesmos, os das fantasias…
E caíram, já, todas as folhas deste Outono. Pelas ruas há só, árvores despidas e vento, murmúrios de gritos, que foram fonte e maresia, voos de aves que nunca estão, que partem simplesmente, que partem sempre.

Paulo Sousa

1.09.2007

És Musica,
Quebras o silêncio e o gelo. Flutuas intangível.
Deixo que os olhos se fechem numa espécie de meditação e vibro a cada compasso. Imagino-te… A tu voz!... Apetece-me sorrir. Éter, apenas! …
O violino chora! Arranca notas a um espírito inteiramente submerso em si,
que devolve ao ar sons que tocam a pele, que balançam os sentidos.
A harpa oferece magia ao toque dos dedos e o piano ilustra-te num horizonte etéreo e brilhante!...
Divinamente humano!... Como eu te sinto!.. És música!
Despertas os mais recônditos medos, num genuíno sentido de arte.

Paulo Sousa